Toninho: Debate da MP 676 sobre a fórmula 85/95

Dissemos com todas as letras que a progressividade era inconstitucional, porque uma lei (e muito menos uma MP) não poderia estabelecer tratamento prejudicial ao segurado do INSS se para o servidor a fórmula tinha sido instituída, e por Emenda í  Constituiío, sem qualquer progressividade e pelo menos nove anos antes.

Antônio Augusto de Queiroz*

Em audiência pública sobre a MP 676, realizada em 2 de setembro de 2015, tivemos a oportunidade de contribuir com algumas reflexões sobre a fórmula 85/95, abordando basicamente três aspectos da referida MP.

O primeiro foi a progressividade na fórmula instituída na MP, que pretende passar da formula 85/95 para 90/100, ao longo de seis anos. Em relaío a ela, apontamos as principais inconsistências.

A primeira diz respeito í  isonomia de tratamento. Para os servidores a fórmula 85/95 foi instituída, como regra de transiío, pela Emenda Constitucional 47, de 2005, sem qualquer exigência de progressividade.

Se para os servidores não há qualquer exigência de progressividade para efeito de aposentadoria integral, que sentido teria fazer tal exigência para os filiados ao Regime Geral de Previdência Social e ainda mais por medida provisória, que tem status ou hierarquia inferior í  Emenda Constitucional?

Dissemos com todas as letras que a progressividade era inconstitucional, porque uma lei (e muito menos uma MP) não poderia estabelecer tratamento prejudicial ao segurado do INSS se para o servidor a fórmula tinha sido instituída, e por Emenda í  Constituiío, sem qualquer progressividade e pelo menos nove anos antes. Além disso, essa matéria jamais poderia ter sido editada por meio de medida provisória, em face do art. 246 da Constituiío, pois se trata de regra de cálculo de benefício, matéria que foi desconstitucionalizada pela Emenda Constitucional 20, de 1998.

A instituiío da progressividade, portanto, é uma forma de discriminaío em funío do vínculo empregatício ou do vínculo a regime previdenciário.

Além disso, não faz sentido nem justiça promover mudança previdenciária sem respeitar, além do direito adquirido, o direito proporcional acumulado, e também sem transiío superior a 20 anos.

O ex-presidente Collor, quando encaminhou ao Congresso o projeto de lei que resultou na Lei 8.213, em 1991, ao instituir o aumento da carência do vínculo com a Previdência Social, para efeito de concessão de benefício, de cinco para 15 anos (ou de 60 meses para 180 meses), propôs sua implementaío com uma transiío de 20 anos, de 1991 a 2011.

Até o economista Fábio Giambiagi, defensor de reformas previdenciárias com viés fiscal, advoga que a transiío para mudanças previdenciárias em relaío a quem já está no sistema não pode ser inferior a 20 anos.

A segunda inconsistência foi a completa ausência de qualquer menío, na exposiío de motivos da MP, em relaío a estudos de natureza atuarial e ou de ordem demográfica que justificassem a progressividade e muito menos com a lógica empregada, de intervalo de dois anos no primeiro aumento das exigências e de um ano nas seguintes.

A terceira inconsistência foi que, uma vez implementada a progressividade, chegando í  fórmula 90/100, haveria a neutralidade em relaío ao fator, ou seja, ela em nada seria benéfica em relaío ao fator.

A explicaío para tanto é que nenhum segurado do sexo masculino alcançaria a fórmula 100 antes de atingir o fator um ou o fator pleno. Mesmo alguém que começasse a trabalhar aos 16 anos dificilmente chegaria aos 44 anos de contribuiío antes de completar 60 anos de idade, porque certamente haveria interrupío na vida laboral ou no pagamento de contribuiío previdenciária ao longo desse período.

O segundo aspecto diz respeito í  situaío dos professores da educaío infantil e do ensino fundamental na MP. Esses profissionais fazem jus í  aposentadoria com 30 anos de contribuiío, se homem, e 25, se mulher.

O fator previdenciário, no caso dos professores, é calculado com acréscimo de 5 anos ao tempo de contribuiío, quando se trata de professor, e de 10 anos, quando se trata de professora.

Diferentemente do fator, a fórmula 85/95 combina dois fatores: o tempo de contribuiío e a idade. A MP — que exige o tempo mínimo de contribuiío de 30 anos ou 35 anos para todos os segurados, sem levar em conta o direito diferenciado dos professores — manda acrescentar cinco anos í  soma de tempo de contribuiío e de idade, sem também levar em conta a diferença de tratamento entre homens e mulheres, o que prejudica os professores e, ainda mais, as professoras. Como não há previsão de acréscimo especificamente na idade considerada para o cálculo, o prejuízo é multiplicado.

Para corrigir essa distorío, alertamos que a MP precisa assegurar o acréscimo de cinco anos também no critério da idade, assim como já ocorre na aposentadoria dos professores do regime próprio. E é preciso, também, garantir o acréscimo de 10 anos í s professoras, ao tempo de contribuiío, visto que, para a mulher, os requisitos para a aposentadoria são menores.

O terceiro aspecto está relacionado í  situaío dos que se aposentaram antes da MP 676, tanto quem requereu o benefício tendo preenchido os requisitos da fórmula 85/95 quanto para quem ainda não tinha preenchido.

No primeiro caso, uma soluío possível seria a adoío de uma regra que determine a atualizaío automática de seus benefícios, com contagem a partir da vigência da MP, já que quando solicitaram o benefício, ainda que a MP não estivesse em vigor, já preenchiam os seus requisitos.

No segundo caso, que inclui os que se aposentaram antes de atingir a fórmula 85/95 e continuaram trabalhando/contribuindo, uma soluío possível seria permitir que esses segurados pudessem solicitar revisão de sua aposentadoria assim que atingissem a fórmula 85/95. Porém, essa conta levaria em consideraío a idade desse segurado na data em que requereu sua aposentadoria (congelamento da idade), mais a soma de contribuições posteriores í  aposentadoria. Algo semelhante ao que propõe o ministro Luis Roberto Barroso em seu voto no RE 661.256 em relaío í  desaposentaío.

Por fim, registramos que o fato de termos participado daquela audiência pública debatendo mudanças na fórmula 85/95 já é um avanço, pois antes a luta era pela adoío da fórmula 85/95 no nosso ordenamento jurídico.

(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentaío do Diap.

Fonte: Diap