Terceirizaío no STF: riscos ao Direito do Trabalho

Por Antônio Augusto de Queiroz*

 
O Supremo Tribunal Federal (STF) está prestes a decidir, com repercussão geral, se é constitucional ou não a restriío í Â liberdade de contrataío de trabalhador terceirizado.

 
A terceirizaío, de acordo com a legislaío e a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, está autorizada em lei apenas para alguns serviços, atividades e setores da empresa contratante, não podendo, como regra, ser utilizada nas atividades-fim das empresas.

 
Inconformada com a restriío legal e jurisprudencial, a empresa Celulose Nipo Brasileira S/A (Cenibra), após condenada a responder solidariamente por ter contratado trabalhadores terceirizados para suas atividades-fim, recorreu da decisão.

 
No curso do processo, a empresa perdeu em todas as instâncias até que o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, depois de ter negado provimento a um recurso extraordinário da empresa, resolveu não apenas aceitar um agravo ao recurso, como também dar repercussão geral í  decisão do STF sobre o mérito da matéria.

 
Se o tribunal entender que tal limitaío, por ausência de previsão expressa em lei, é inconstitucional, ou seja, que as empresas poderão utilizar livremente o trabalho terceirizado, em qualquer ramo ou nas atividades-meio e fim das empresas contratantes, a consequência disso será dupla: a precarizaío generalizada das relações de trabalho e o fim da Justiça do Trabalho e do próprio Direito do Trabalho.

 
Ora, se a terceirizaío, mesmo com as restrições atuais, já representa 25,5% do mercado formal de trabalho e, nas relações de trabalho, significa menor salário, maior jornada, piores condições de trabalho, alta rotatividade e aumento de demanda trabalhista e previdenciária, imaginem o que ela significará podendo ser generalizada.

 
Já o Direito do Trabalho, como bem pontua o advogado Luiz Salvador, que se notabilizou por buscar a entrega da prestaío jurisdicional, pela simplicidade, oralidade, economia processual e sempre visando soluío rápida no reconhecimento dos direitos resultantes dos créditos trabalhistas, perde a razão de ser com a possibilidade de generalizaío da terceirizaío em bases precárias.

 
Como norma de ordem pública e caráter irrenunciável, o Direito do Trabalho atribui ao trabalhador a condiío de hipossuficiente (parte mais fraca) na relaío com o empregador e com base nesse princípio considera nulo de pleno direito qualquer acordo que, diretamente ou indiretamente, resulte em prejuízo ao empregado, sob o fundamento de que houve coaío.

 
Se o Direito do Trabalho perder a razão de ser – e a terceirizaío generalizada será o primeiro e fundamental passo nessa direío – não faz sentido manter a Justiça do Trabalho, cuja funío exclusiva é colocar em prática, observadas as leis protetivas aos trabalhadores, o Direito do Trabalho.

 
Registre-se que boa parte do esforço das entidades patronais tem sido no sentido de eliminar o Direito do Trabalho, que é de natureza protetiva. A ideia patronal é aplicar í s relações de trabalho o Direito Civil ou Comum, que parte do pressuposto de igualdade das partes. Se pessoas ou instituições fizerem um acordo, desde que os subscritores estejam no uso pleno de suas faculdades mentais, esse acordo tem força de lei e vale para todos os fins legais, só podendo ser anulado por dolo, fraude ou irregularidade.

 
Uma eventual decisão do STF favorável í  empresa, com repercussão geral, na opinião de advogados militantes na Justiça do Trabalho, é tão ou mais grave do que a aprovaío do Projeto de Lei nº 4330-A/2004, de autoria do deputado Sandro Mabel (PR/GO), em debate na Câmara dos Deputados, que trata da regulamentaío da terceirizaío.

 
A expectativa das entidades sindicais, de advogados e de magistrados, assim como dos próprios trabalhadores, considerando que a Constituiío estabelece como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e a valorizaío social do trabalho, é de que o STF, apesar de já ter aceito a repercussão geral, possa voltar atrás ou mesmo aceitar a restriío no mérito, por ocasião do julgamento da matéria no pleno do Tribunal. Para tanto, é preciso agir e reagir.

 

(*) Jornalista, analista político e Diretor de Documentaío do Diap.

 
Fonte: Diap